Friday, May 17, 2019

o chifre dos outros - por que me atingiria?

Um dia, um sábio irmão me disse, quando eu ainda era criança: "se eu encontrar a mulher de um amigo na rua com outro cara, eu não conto! Pois se contar perco o amigo...."

Vendo o desenrolar deste governo "idiota útil"* que somos, penso nos (ex-?)amigos que declararam voto no atual idiota inútil na presidência, à época ainda como um mero "#elenão", em desesperança sangrenta a caminho.

Eu vejo três possibilidades clássicas para o amigo traído da história: A) nunca descobrir, daí segue como traído. Ou ainda, tomar conhecimento da situação, por si, pela própria mulher ou por outrem, e daí: B) desistir da relação, ou C) seguir na relação. É fundamental frisar que escolhe-se seguir na relação por muitos e diversos fatores quase sempre profundamente misturados entre si, desde a comodidade para evitar mudanças, até o orgulhoso pacto de tentar uma relação transcendente aos padrões - e será que já não havia este pacto antes do tal flagra? De qualquer forma, fora o pacto preexistente, que não se aplica em nosso caso de estudo à frente, existirá uma perda a enfrentar.

...

Ligando os pontos acima, penso nestes amigos e imagino seus sentimentos mais íntimos. Claro que ainda tenho uma reduzida esperança de poder conversar com estes, ainda que eu precise admitir que, numa visão pragmática do paradoxo do Karl Popper*, ainda não consigo nem pensar em interagir com estes.... Talvez o que sinto seja mesmo aparentado com àquela sensação do primeiro encontro com o amigo supostamente traído, logo após o tal flagra hipotético da historinha acima..

Eu costumava chamar isto de "vergonha alheia", mas as eleições que levaram o Bolsonaro ao poder tornaram este termo meio inútil, posto que elevou a vergonha à "padamares" impensáveis, a tal ponto de reverter a decisão antológica de nunca mais precisar mudar o lado da rua para evitar alguém, como um "ex-conge" assumido, por exemplo. Imagino hoje que alguns daqueles sentem seus "chifres eleitorais" já crescidos e vistosos e procurem uma auto avaliação que possibilitem sua circulação nas ruas sem nenhum tipo de constrangimento ou vergonha da relação estabelecida. Porque, ao meu ver, não se trata de "arrependimento". Arrependimento vem de um acordo aberto que não tenha dado certo. O candidato #elenão não trazia acordos para a mesa, nem fazia debates e nem apresentava planos de governo, confere? Portanto o que quero evidenciar aqui prefiro qualificar como vergonha: "sinto vergonha disto que fiz no passado!", e isto tem um sinônimo forte: desonra.

Pressinto que não são todos aqueles os amigos que sentem -e mesmo ainda que só um pouquinho, esta sensação de desonra. Mas tenho uma esperança! Pois neste caso as alternativas seriam ainda mais doloridas e afastadoras: assumir mais claramente o declarado gosto pela tortura, o racismo explícito e o egoísmo doentio do "farinha pouca meu pirão primeiro" mesmo estando de prato cheio até a borda.  E por isso considero que praticamente todos aqueles estão nos diversos estágios da tomada de consciência da desonra. Vou pegar emprestado o modelo de Kubler-Ross sobre o caminho de como lidar com as perdas:

  1. Negação: "Isto não pode estar a acontecer."
  2. Raiva: "Por que eu? Não é justo."
  3. Negociação: "Deixe-me viver apenas até ver os meus filhos crescerem."
  4. Depressão: "Estou tão triste. Porquê me hei-de preocupar com qualquer coisa?"
  5. Aceitação: "Vai tudo ficar bem.", "Eu não consigo lutar contra isto, é melhor preparar-me."

Por um caminho tortuoso cheguei onde queria: tirando os assumidos torturadores e demais "armamentistas" de plantão, creio que a enorme maioria de nós estamos atravessando estes estágios, qualquer quer que tenha sido nossa escolha nas últimas eleições, e temo que apesar de nossas escolhas terem sido diferentes - e até opostas, nas eleições, estejamos chegando juntos em um enorme grupo na fase da depressão, sem perspectivas sobre como seguir nos cenários que podem ser vislumbrados. "Kübler-Ross originalmente aplicou estes estágios para qualquer forma de perda pessoal catastrófica", e isso se aplica a mim, ou seja, eu me reconheço numa perda pessoal catastrófica. Desta forma, o "chifre dos outros" já me atingiu, e em cheio...


PS importante:
primeiro não quero polemizar sobre todo o preconceito capitalista patriarcal que o conceito "chifre" pode trazer, mas a sensação que pode estar acompanhada no qeu usei como exemplo. depois me coloco também na situação simétrica e me imagino criando vergonha alheia em muitas (mas muitas mesmo), inclusive uma antológica que vivi com o mesmo irmão quando era igualmente criança, e para quem peço perdão e compreensão pelos caminhos obtusos e idiotas que tomamos na vida...

* obrigado ao Bob Fernandes pelo vídeo de hoje, e pelo esclarecimento lógico para nominar abertamente o atual presidente, aqui: 
https://www.youtube.com/watch?v=EAJE0X8r1oI&feature=youtu.be

Falei de Karl Popper aqui:
http://pedrogmfontes.blogspot.com/2018/02/desservico.html

Kubler-Ross, da wikipedia:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Modelo_de_K%C3%BCbler-Ross


Wednesday, May 1, 2019

AlgoRítmico: do ritmo ao algoritmo

Da Wikipedia: "Em ciência da computação, um algoritmo é uma sequência finita de ações executáveis que visam obter uma solução para um determinado tipo de problema."

Num mundo filtrado, o facebook escolhe o que eu vejo.
Escolhia, não escolhe mais... 
e enquanto ele escolhia, eu encolhia!

Dia primeiro de maio, dia bem significativo para implementar um projeto de dois anos, que de certo modo parece contrariar certas tendências: encerrar minha conta do fb. 
Nem quero trazer à discussão esta decisão (afinal, eu publiquei 10 vezes esta intenção no próprio fb e não houve nenhuma - insisto: zero! respostas ou comentários sobre isto), mas usar meu e o teu tempo para refletir e aprofundar não só o papel das mídias sociais, como principalmente redefinir o tempo que nos consome em frente aos aparelhos eletrônicos e minhas fontes de informação e trocas afetivas. 
Será bom reviver minha decisão de, em 1996, retirar a TV de casa, objeto do qual nunca senti nenhuma falta em casa. Na época, junto com cortar o consumo de açúcar, eu era meio que um ET considerado muito esquisito. Acho que nunca deixei mesmo de ser esquisito, mas com o tempo passei a encontrar mais e mais gente que havia cortado o açúcar, e em seguida a TV. Passei a me sentir mais como um esquisito com pitadas de visionário.... Mas precisamos reconhecer o quanto os streams de video estão a desafiar a todos nós com flixs e flits diversos a nos afogar em séries, quase todas interessantes e bem feitas, mas que ao fim e ao cabo o que nos acrescentaram?

Do título, vou pescar o processo de como o fb (com referência, mas certamente não só ele) acaba ditando meu ritmo de todo dia, e acredito no teu também, se não todo, ao menos em parte. E claro que reconheço que não é exatamente o fb, ele é só talvez o melhor e mais abrangente exemplo. 
Os smartphones por si mesmo já são uma praga contemporânea, que sabidamente* podem filmar e gravar tudo que "assistem". O que mais me assusta - e fascina. ao mesmo tempo, é ver que pouca gente (eu generalizaria como "ninguém" mesmo) parece estar muito disposto a combater isto (já temos tanta coisa pra combater, não é?). 

Meu desejo é (re)criar um ritmo mais humano para mim e para quem desejar partilhar estas energias (re)criadoras. Daí este blog que já existia antes, vem bem a calhar como uma plataforma de contato aos que estão / estarão distantes. Mas já sofreu críticas duras (infelizmente não quanto ao conteúdo, pois eu sou do tipo de pessoa que gosta de criticas, especialmente as duras...). Mas exatamente por tentar trazer o conteúdo do fb para fora daquela plataforma, que vai aos poucos se transformando numa espécie de repositório de nossas coisas pelo conteúdo e pelas conexões que ali estão.

Mas eu não quero mais que o algoritmo "traga uma solução para um determinado tipo de problema" na minha comunicação. Até porque hoje eu tenho plena convicção de que o tal (algoritmo) opera não só com interesses escusos (semi)ocultos, como - pior, é manipulável por fora do sistema, pelo sistema maior (teoria da conspiração? Se for, prefiro correr o risco de remar contra a maré do que repetir o "eu te disse!" cruel e odiento....)

Então te convido a ...

  • manter contato, por aqui, por ali ou acolá (meu email é o mesmo há décadas)
  • escrever seus textos. Compartilhar o dos outros pode ser muito bom, mas desenvolver a escrita é melhor!
  • visitar outras fontes, na própria fonte ao invés de internamente ao fb. Daí dá pra perceber que não só o teu próprio "algoritmo" é mais eficaz, como principalmente que nós vamos quase sempre nas mesmas fontes e de lá vai ser mais fácil (eu acredito) ver que estamos só nas mesmas fontes - que afinal é o que o fb acaba fazendo como filtro pra nós mesmos
  • estudar filosofia e sociologia, outra vez na contramão, não é? E enquanto o rolo não passa, meu querido professor Clovis de Barros Filho está fartamente no youtube auxiliando aos que não tem os livros, ou matrícula na universidade ou ainda tempo para outra forma de aprendizado....
  • ler um livro ao menos entre cada série que assistas (melhor ainda: pelo menos um capítulo entre cada episódio, mas aí já é pedir demais, né?)
  • ligar para um amigo diferente e falar, de voz falada, e de tempo de escuta, ao menos uma vez por semana.
  • se apaixonar pela vida e pela humanidade, que me parece ser a fonte de energia essencial para resistir à barbárie à vista.
  • Resistir à barbárie. Com humanidade. Com decisão. Com cautela. Com amor. 


O próximo desafio agora será retornar ao modelo mais simples de smartphone, e tirar o sofá do George Orwelll da sala... 
E como não estou mais lá, que tal deixar de vez em quando um comentário aqui (ou me mande um email), pra isso não ficar sendo um palanque, e sim uma roda de conversa, hein?

* licença duplo sentido