Tuesday, December 1, 2020

bolo-bolo, zap-zap, bobo-bobo...

 bolo-bolo é um livro lançado lá pela década de 70/80 que contém um tipo de utopia comunitária de abrangência global. Eu gostei de tê-lo lido por diversos fatores; quem quiser acesso ao texto, me fala que eu indico como conseguir. É leve, interessante e razoavelmente divertido, além de ser, inevitavelmente, um pouco ingênuo em suas proposições de organização social. 

Escolhi o livro para referenciar neste texto pelo fator ingenuidade. Acho o aspecto ingenuidade um assunto fascinante, talvez -e principalmente -  porque todos tem acesso ao assunto, qualificação para análise e debate. Na verdade não temos escapatória aqui: somos todos quase reféns deste assunto. Não proponho aqui analisar em profundidade o que é a ingenuidade, mas vou me permitir um reducionismo para apresentar como no dicionário (1): "Ingênuo: 1. Em que não há malícia, simples, franco. 2. Puro, inocente, singelo. 

Aqui começa o reducionismo que proponho para o momento: vou usar ingenuidade como contraponto ao malicioso. Da mesma fonte, eu escolhi: "Malícia: 1. tendência para o mal, (...) 3. Sagacidade, astúcia, manha, ronha.". Então mantendo uma perspectiva simplificada, podemos contrapor a ingenuidade à malícia, e neste eixo localizar uma certa inocência da vida, e ainda neste eixo, uma conduta estratégica deliberada representada pela tal sagacidade aí da definição.

O problema começa na nossa própria atitude reflexiva para assumir conscientemente onde estamos sendo ingênuos. Costuma ser uma condição que gera alguma dor, acompanhada do maravilhamento das possibilidades da descoberta (a princípio de qualquer coisa que seja). O contraponto que aparece deveria ser a atitude reflexiva contrária, ou seja, a reflexão sobre "a minha sagacidade" para conquistar o que eu quero.

Pronto, está posto o quadro para justificar minha tese: debater um dilema social demanda uma atitude crítica que contenha estes dois elementos essenciais do espectro da consciência

Venho buscando debater o Dilema das Redes, filme produzido e veiculado no Netflix, sobre as redes sociais da internet, seus usos, processos e consequências. Pelo caminho encontrei umas poucas pessoas que toparam este debate, afinal o filme contém, em minha opinião, declarações fortemente impactantes e é montado com todo a eficiente estrutura fílmica para dar credibilidade e atratividade dos filmes da plataforma.

A generalização de debate seria o assunto que me interessa mais frontalmente, mas neste momento vou me permitir elaborar um juízo crítico a respeito das rodadas de debate deste assunto que participei recentemente. 

Enfrentar o desafio de debate sobre "DILEMA" me parece exigir que entendamos de partida SOBRE QUAL DILEMA iremos nos debruçar. Este problema pode parecer pequeneza metodológica, mas ao aprofundar um pouquinho na perspectiva do próprio filme em questão, vamos encontrar que não há uma explicitação coerente sobre o dilema que é apresentado, deixando maliciosamente ao critério do espectador perceber que há conflito de interesse evidente na elaboração discursiva sobre este dilema. Aqui recomendo a análise do Mauro Iasi sobre isso, links abaixo, e que de forma didática e tranquila abre uma frente de debate consistente e elaborada para o assunto. Não acho que ele esgote as possibilidades ou perspectivas. Até ao contrário: ao elaborar o assunto dentro de uma perspectiva consistente, nos permite construir (e debater) as ideias e conceitos que ele utiliza, concordar e discordar, mas principalmente se manter numa postura crítica sobre qual dilema estamos debatendo.

Não tenho conseguido contribuir de forma positiva (ou melhor, propositiva) nos círculos de debate que me inseri, mas vou deixar aqui as considerações que julgo mais importantes sobre os eventos:

  1. debater assunto de tal complexidade sem uma preparação prévia adequada exacerba o risco de ficar na superfície do assunto;
  2. o tema me parece especialmente escorregadio; mas minha impressão vai além da especificidade do assunto: o assunto está apresentado de forma a esconder os dilemas que diz apresentar;
  3. ao conduzir o debate do tema conforme apresentado pelo próprio filme, assume-se o viés dele; e fazê-lo sem questionar este viés, é uma postura que julgo deliberadamente ingênua (e pode-se substituir sem risco: maliciosamente ingênua).
Meu grande desconforto em seguir participando de debates assim decorre destas condições. Em resumo brevíssimo, posso dizer ele nasce e se alimenta nas atitudes individuais expostas em grupo (nas redes sociais E nestes debates) que tem nítido viés em alavancar as alegrias individuais e em relativizar as tomadas de decisões coletivas. Como consequência, o cenário geral é de cada um procurando as respostas sobre o que fazer para que sua vida fique melhor, e assim, alegremente seguir encobrindo os mais importantes dilemas que poderiam efetivamente gerar alguma ação coletiva para enfrentamento ao dilema. Mas como, se ele nem foi claramente posto?




1. Autélio séc XXI

2. Mauro Iasi analísa o dilema (curto: https://youtu.be/QZAmYwuTd2c ; ou melhor: o video inteiro e excelente: https://youtu.be/mZ0B4s3wTAM )