Saturday, January 22, 2022

tic........

 na foto tudo parece igual... já parecia antes, mas agora, parou; e parado, reune o que separou, conecta pontas de tempos distintos e (re)move ilusões que pareciam somente minhas antes.

na foto tudo mudou. mudou me a mim, a ti, a ela, que sendo o que foi, sendo a que foi, ficou sendo. só.

na foto tudo mudou. o suporte físico, a química, o quarto escuro, a pinça pendurada, o exaustor barato, a luz vermelha. agora corre quarto de segundo entre o antes e o depois, já sem meia graça, sem graça, sem meia

na foto tudo mudou. nariz cresceu, cabelo caiu, dente quebrou, cara quebrou, ruga marcou, pele manchou... brilho resiste, insiste

o contraste parece querer ser tudo, ser todo. os delicados cinzas do ansell que me mostraste desvaneceram ainda mais... restaram na cabeça

as cópias rarearam, leicas rarearam, wilmas rarearam, marílias rarearam... e nós mesmo, rareamos

agora o instantâneo, ultra multiplicado por zilhões, congela o instantâneo num tudotodos de nemninguém que o sorriso congela, a dor congela, a garça congela, a graça congela 

a foto vira filme, vira stream, virestrim, remédio de(s)memória 

a foto, que ninguém viu, essa ficou. em mim, em ti. na lembrança do que senti, do que pensei que sentias, no que senti que sentias

e assim, em mim, fica também em ti. e nela, e nele. e afinal, em todos aqueles que a foto estampou, destampou. na parede da memória

a casca sagrada do agora. na fina camada que reveste o olho, eu olho. para o que ficou, para o que mudou, para o que muda, muda o que para.

muda. a foto.